segunda-feira, 4 de julho de 2011

Manuela Moura Guedes manda em Passos Coelho?

Falemos hoje de uma situação muito mal esclarecida deste governo. Muito mal esclarecida e que nada dignifica nem o executivo, nem a nossa (parece que já) pobre democracia. Refiro-me ao episódio Bernardo Bairrão. O EXPRESSO desta semana fez um trabalho notável (e que convido o leitor a consultar com toda a atenção) sobre a história do secretário de Estado da Administração Interna que não o chegou a ser. No entanto, o episódio tem aspectos muito preocupantes e revela o primeiro sinal de fragilidade de alguns membros do governo e mesmo do Primeiro-Ministro:
a) Apesar de o Expresso no sábado afirmar que a história nada teve a ver com Marcelo Rebelo de Sousa, a verdade é que, na sequência de um texto meu anterior sobre o tema, recebi um mail de uma figura relevante do PSD a concordar com a minha tese (a de que Passos quis tramar Marcelo Rebelo de Sousa) e que o Professor será corrido da TVI dentro de 4 meses. Até porque Bernardo Bairrão demitiu-se do estação de Queluz de Baixo, afastando-se desta forma o grande entusiasta da contratação de Rebelo de Sousa. Se assim for, confirma-se que Passos Coelho não abdica dos métodos Socráticos de domínio da comunicação social. E Miguel Pais do Amaral, que na sequência de pressões do governo Santana Lopes tentou calar Marcelo, até já domina a TVI e grande aliado de Paulo Portas;
b) Manuela Moura Guedes ligou para Passos Coelho contra a inclusão de Bernardo Bairrão no governo. E foi aí que tudo se precipitou. Se assim foi, significa que o Primeiro-Ministro de Portugal tem medo de Manuela Moura Guedes! Então, decide-se em função de um SMS da jornalista que esteve para a SIC, mas já não vai? O casal Moniz manda em Passos Coelho. E Miguel Macedo ligou a Bernardo Bairrão para justificar que a saída se deve a pressões de vários lados. Ora, isto é digno de uma República das Bananas! Se o governo não consegue resistir a pressões pela nomeação de um secretario de Estado, quem nos garante que terá autoridade para tomar medidas dificéis indispensáveis para o futuro de Portugal? Quem nos garante que não ficará refém destas pressões? É um péssimo sinal...
c) Mais uma vez, nesta história, aparece a Ongoing, a empresa mais misteriosa deste país. Que tem nos seus quadros gente ligada a Passos Coelho. Será que a promotida privatização da RTP é uma cedência á Ongoing? Não sei...Mas que tudo isto é muito estranho, lá isso é. Entretanto, Portugal e os Portugueses sofrem...
P.S.- A Ongoing processou o Nicolau Santos, jornalista do Expresso, por uma opinião bem fundamentada e certeira. Quanto a mim, empresas que tentam silenciar pelo medo são sempre de desconfiar...digo eu...

texto de João Lemos Esteves no Expresso

Continuação do Capitulo anterior
Publicado no expresso

A saída de Bernardo Bairrão da lista de secretários de Estado foi o ponto final num processo de bastidores que se desenrolou em pouco mais de 24 horas. Um processo que começou com um SMS de Manuela Moura Guedes para o telemóvel do primeiro-ministro, na noite de domingo, e que acabou por envolver vários ministros numa tentativa de perceber se havia ou não algum 'caso' que pudesse impedir Bernardo Bairrão de transitar de administrador da TVI (Media Capital) para a equipa do Ministério da Administração Interna.
O núcleo político do Governo não chegou a nenhuma conclusão sobre as suspeitas mas ficou assustado com as pressões e deixou cair Bernardo Bairrão sem apelo, apesar de este ter sido formalmente convidado para o cargo uma semana antes, com o conhecimento de Passos Coelho.
Ao contrário do que fontes do Governo deram a entender, o recuo não teve nada a ver com a fuga de informação de Marcelo Rebelo de Sousa. Esteve, tão-só, ligado a guerras antigas da TVI, que foram ajustadas na semana passada. E a um clima epidérmico que a possível privatização da RTP provocou em grupos interessados. O calendário dos acontecimentos ajuda a esclarecer o caso mais estranho do Governo.
Segunda-feira, 20 de junho. Miguel Macedo convida Bernardo Bairrão para secretário de Estado da Administração Interna. O convite foi feito depois de Passos Coelho considerar uma ótima escolha e não achar impeditivo o facto do administrador da Media Capital ser contra a privatização da RTP. Bernardo Bairrão pediu dois dias para pensar.
Quarta-feira, 22 de junho. Bernardo Bairrão vai a Madrid falar com os espanhóis da Prisa, acionistas maioritários da Media Capital. Diz-lhes que vai aceitar o convite e telefona a Miguel Macedo.
Quinta-feira, 23 de junho. Já em Lisboa, Bernardo Bairrão informa os colegas de administração da Media Capital de que vai ocupar um cargo público.
Sexta-feira, 24 de junho. Bernardo Bairrão comunica a José Alberto Carvalho, diretor de informação da TVI, que vai ocupar um cargo público.
Sábado, 25 de junho. A administração da TVI decide que tem de informar a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) na segunda-feira sobre a saída de bernardo Bairrão, porque se trata de um "facto relevante" de uma empresa cotada em Bolsa.
Nesse mesmo dia, Marcelo Rebelo de Sousa é informado por um membro do Governo do PSD de que Bernardo Bairrão vai para a equipa de Miguel Macedo. Nesta altura, a informação é do conhecimento de todo o núcleo político do Executivo, que a considera uma "grande contratação".

Moura Guedes enviou SMS a Passos Coelho e a partir daí o medo de um 'caso' disparou


Domingo, 26 de junho, 18h30. Bernardo Bairrão sabe que Marcelo Rebelo de Sousa vai divulgar a sua saída e vai à TVI falar com o comentador. Por precaução, avisa Júlio Magalhães, pivô do "Jornal da TVI", para este não ser apanhado de surpresa no ar.
Domingo, 26 de junho, 20h. Marcelo Rebelo de Sousa divulga a ida de Bernardo Bairrão para o Governo. É aqui que tudo se precipita.
O momento pode ser assinalado com precisão porque decorre de um SMS enviado por Manuela Moura Guedes para o telemóvel de Passos Coelho e que levou o primeiro-ministro a levantar a questão a outros membros do Governo, para saber se existia algum 'caso' com Bernardo Bairrão.
O SMS levantava suspeitas antigas sobre alegados negócios de Bernardo Bairrão. Um tema que era falado nos meios jornalísticos, sobretudo depois da rápida saída do ex-diretor de programas da TVI, André Cerqueira, para o Brasil. Nessa altura circularam informações sobre alegados negócios de quadros da TVI com a TV Zimbo em Angola e o "Correio da Manhã" chegou a publicar uma notícia sobre isso. Mas nunca se soube nada de concreto.
Os factos públicos remontam ao tempo em que Bernardo Bairrão e José Eduardo Moniz eram muito próximos. A ponto de terem constituído uma sociedade em 2008 para prestarem serviços de consultoria no lançamento da TV Zimbo, de Angola. A sociedade teve vida curta, porque um ano depois a TVI estabeleceu um protocolo com os parceiros angolanos.
Mais tarde, a Plural (produtora da ficção da TVI) entrou como sócia minoritária na Plural Angola. Estas parcerias sucitaram comentários na estação de Queluz, sobretudo depois de Bernardo Bairrão ter ficado na administração que negociou a saída de José Eduardo Moniz da TVI e que afastou Manuela Moura Guedes dos ecrãs nas vésperas das legislativas de 2009.
José Eduardo Moniz é hoje vice-presidente da Ongoing, grupo interessado na privatização da RTP.
Foi este o tema que renasceu na noite de domingo, a ponto de assustar o primeiro-ministro, que tinha imposto regras claras de que ninguém com eventuais 'casos' jornalísticos ou judiciais devia entrar para o Governo.
Segunda, 27 de junho, início da manhã. Paulo Portas telefona a Miguel Pais do Amaral, homem-forte da Media Capital (e ex-patrão de Portas n'"O Independente") para saber se há algum problema na vida empresarial de Bernardo Bairrão. A resposta tranquiliza Paulo Portas, que informa o primeiro-ministro. À mesma hora, Miguel Relvas, ministro dos Assuntos Parlamentares, fala com Manuela Moura Guedes. Feito o balanço dos telefonemas, é decidido manter Bernardo Bairrão na lista.

Bairrão foi chamado ao MAI a meio de um almoço de despedida com Miguel Pais do Amaral


Segunda, 27 de junho, 11h. Passos Coelho leva a lista, com o nome de Bernardo Bairrão, ao Presidente da República.
Segunda, 27 de junho, 13h. Miguel Pais do Amaral almoça com Bernardo Bairrão no seu restaurante preferido de Lisboa, o Mezzaluna.
Segunda, 27 de junho, 14h30. No restaurante, Bernardo Bairrão recebe um telefonema de Miguel Macedo preocupado com pressões e insinuações que circulam. Bernardo Bairrão avança para o ministério. É aí que é confrontado com as informações sobre Angola e alegadas queixas da Ongoing, que tem ligações muito diretas à equipa de Passos Coelho.
Segunda, 27 de junho, 15h. Miguel Macedo chega à reunião do Conselho de Ministros ainda com Bernardo Bairrão na equipa. Mas as pressões continuam. Além de Manuela Moura Guedes e José Eduardo Moniz (que estava no Brasil, em representação da Ongoing) - e de cuja influência Miguel Macedo se queixou a várias pessoas esta semana -, a privatização da RTP fez o resto. Vários ministros receberam informações antes e durante o Conselho de Ministros sobre o 'caso' que podia atrapalhar o Governo nos seus primeiros dias de vida. Durante as duas horas de reunião há SMS a circular sobre o assunto, e as pressões alargam-se ao mundo empresarial, alegadamente a quem representa interesses diretos na privatização da RTP. Miguel Macedo percebe que está a perder o jogo.
Segunda, 27 de junho, 17h. O Conselho de Ministros acaba e Passos decide retirar Bernardo Bairrão da lista. Paulo Portas não terá sido informado logo da decisão. Miguel Macedo fica lívido mas obedece para não criar problemas ao Governo.
Segunda, 27 de junho, 18h. Bernardo Bairrão avança de novo para o Ministério da Administração Interna para reunir-se com Miguel Macedo. No caminho, percebe que as edições online dos jornais já dizem que o seu nome saiu da lista. Bairrão e Macedo combinam a frase das "razões políticas e pessoais", que vão repetir no dia seguinte como motivo da desistência.
Segunda, 27 de junho, 20h. No Governo, criam-se as habituais cortinas de fumo: a fuga de informação de Marcelo Rebelo de Sousa, o alegado desconhecimento do convite e o facto de Bernardo Bairrão ser contra a privatização da RTP. Mas o caso não passou por aí.
Terça, 28 de junho, 20h17. Um longo email de Bernardo Bairrão chega a todos os trabalhadores da TVI. Nele, o administrador reafirma que "mesmo perante os últimos desenvolvimentos" mantém a intenção de sair do grupo. Assume que parte "com a consciência tranquila de tudo ter feito para defender os interesses das empresas - TVI e Plural" a que esteve ligado. Diz ainda que viveu aqui "momentos bons, maus, péssimos e fantásticos" e que tomou "boas e más decisões, das que gostaríamos de poder voltar atrás para corrigir. Mas o tempo não volta atrás".
Contactada pelo Expresso, Manuela Moura Guedes "desmente totalmente" as informações recolhidas e garante não ter "qualquer relação pessoal com o primeiro-ministro", com quem contactou "apenas para o entrevistar para o 'Correio da Manhã'". Já José Eduardo Moniz considerou o assunto "uma imbecilidade" que, acrescenta, "não tem fundamento nem faz sentido". Acabado de chegar do Brasil, recusou acrescentar qualquer outro comentário

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